Sofrer não é normal e a faculdade se torna um peso

21-07-17-01

“A universidade me adoeceu, me mudou, me fez sentir que não sou capaz”. Grandes expectativas. Aulas em dois turnos nos cursinhos pré-vestibulares. A vontade e curiosidade de saber o que vem depois do Ensino Médio. A ideia das faculdades que filmes hollywoodianos apresentam é um tanto quanto exagerada. O período em que o jovem está se tornando adulto e cidadão  era para ser algo enriquecedor, encorajador. Na realidade, torna-se um período em que emergem sentimentos de incapacidade que podem acarretar doenças sérias.

Atualmente inúmeros jovens sofrem com doenças psíquicas e transtornos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 20% dos adolescentes brasileiros sofrem de depressão. Estudos da psiquiatria da Universidade Federal de Minas Gerais apontam que a desconfiança do próprio desempenho, insônia, estresse psíquicos, transtornos mentais menores podem se desenvolver para distúrbios mais graves entre os universitários.

Uma pesquisa realizada com 100 graduandos apontou que 68% dos estudantes desenvolveram algum distúrbio físico ou psicológico no período universitário, como depressão, ansiedade, gastrite, pânico, crises de enxaqueca, insônia, entre outras. Ela foi desenvolvida pelas autoras desta reportagem como exercício na disciplina de Jornalismo III, sob responsabilidade da professora Glaíse Palma. Partiu-se da hipótese de que a faculdade estava provocando processos de adoecimento entre os acadêmicos. Através um questionário para veiculação on line, com a opção de identificar ou não quem respondeu, foram obtidas em três dias, 100 respostas anônimas. Os dados evidenciaram que a realidade era pior do que a imaginada inicialmente.

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“ Após entrar para a universidade, desenvolvi depressão e ansiedade, tomei antidepressivos por algum tempo, passei a me sentir melhor e parei com a medicação. Nos últimos tempos me sinto mal novamente, tenho crises fortes de ansiedade onde não consigo respirar. Também tenho crises de choro semanais, que em alguns períodos se torna diária. Penso muitas vezes em largar o curso e ir embora da cidade ou que gostaria de ficar muito doente para poder parar com a faculdade por um tempo. Estou pensando em procurar auxilio psicológico”. Depoimento anônimo.

Segundo o coordenador do serviço de triagem do Programa de Atenção Integrada em Psicologia (PAIP), Carlos Décimo, a universidade pode ser cansativa e desgastante. Porém, ele ressalta que depende de como a pessoa chega na universidade – às vezes cansada e estressada -, e como lida com os trabalhos e provas. O aluno pode se sentir inseguro, diante de algumas práticas e exercícios. Como  também nas disciplinas do curso, alguns gostam outros não.

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A subjetividade de cada um

O desenvolvimento de transtornos não é, necessariamente, desencadeado pela universidade. “A pessoa tem suas circunstâncias e suas patologias, ao entrar na faculdade, pode potencializar esse transtorno. Por exemplo, um jovem que tem fobia social, medo de ser analisado pelo outro, quando entra na universidade ele é posto em público, aos olhos do outro e,então, ele tem que apresentar trabalhos, se expor, e não consegue”, explica Décimo. “Já existia a doença e , assim,  a evidenciamos”. Isso pode ser percebido em determinadas situações que desencadeiam o transtorno. Entre os fatores que desencadeiam  esses processos está o estimulo à competição entre os estudantes, que parte dos professores promovem durante o curso, nas aulas, nos trabalhos, nas provas. Para o psicólogo, o conceito de capacidade e inteligência vem mudando, não tem como saber tudo ou ser o melhor em tudo, temos áreas que dominamos melhor, atividades que desenvolvemos melhor. “Mas inteligente no quê? Para que? Ou ser bom no quê? As pessoas não serão competentes em tudo. Acabamos vendo áreas nas quais temos mais facilidades, que temos mais habilidades. Essa questão de ser o melhor em tudo precisa ser revista ”, afirma ele.

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Para a estudante de psicologia, Ana Carolina Bragança, sem dúvida, o ambiente acadêmico é um fator que pode elevar o estresse e a ansiedade. Algumas vezes, as exigências neste meio são maiores do que deveriam. Muitas veze, o estudante acaba por abdicar das horas de sono, de bem-estar, das atividades de lazer e de fazer coisas do seu gosto por falta de tempo. A alta demanda vinda da universidade causa ou aumenta o estresse, advindo com a ansiedade de completar tarefas dentro de um prazo que nem sempre pode ser flexível.

“Ter responsabilidades e exigências no mundo acadêmico é natural, porém, quando este invade outras áreas da vida ou faz abrir mão de muitas coisas para atender a ele, algo pode estar equivocado, até mesmo nas formas de avaliação dos professores. O estudante possui várias disciplinas as quais tem que conciliar e empenhar-se para obter o mínimo de êxito”, aponta a estudante. Ana Carolina acredita que, tanto as instituições quanto o quadro docente, deveriam estar mais atentos ao contexto de vida dos acadêmicos, que têm suas obrigações também e, às vezes, extrapola nestas. Pode haver diálogo entre alunos e professores. A estudante afirma que em situações em que fica difícil suportar, ou prejudica de alguma forma a saúde mental do universitário, pode existir um acordo  que fique bom e coerente para os dois lados. “Esta seria uma forma de lidar com as desavenças e  não deixando de realizar atividades fora da vida acadêmica que lhe proporcionem bem-estar”, completa.

“Tive uma crise de ansiedade em sala, e após o período de atestado, fui ridicularizada por professores e colegas”, depoimento anônimo.

Sintomas de que as coisas não vão bem por dentro

É importante entender que a indução a acreditar em determinados comportamentos tais como ansiedade constante e privação de sono sao normais e fazem parte desse período da vida, é equivocada. Eles não são normais e são prejudiciais à saúde. É necessário estar atentos para sinais que surgem no cotidiano e são alertas de que algumas coisas podem não estar indo bem.

Psicólogos alertam para alguns sintomas que merecem atenção, como: agitação, irritabilidade, ansiedade, culpa, sofrimento emocional, choro excessivo, fadiga, fome excessiva ou falta de apetite, insônia, pensamento suicida, etc. Caso perceba se perceba esses sinais em si próprio ou em algum (a) amigo (a), procure algum tipo de ajuda. Conversar sobre o que está sentindo pode ser libertador. Muitas pessoas estão sentindo o mesmo.

Culpa é um dos sintomas que merecem atenção. (Crédito: Juliano Dutra – Laboratório de Fotografia e Memória)

Já sofria com a ansiedade e a depressão antes de entrar na Universidade, mas após o ingresso as coisas só pioraram. Quando fico sobrecarregada, me sinto muito nervosa, causando até mesmo efeitos físicos. Já deixei de estudar diversas vezes e de entregar trabalhos por esse motivo. Numa vez, até mesmo reprovei numa disciplina, pois tive uma crise durante a prova e a entreguei em branco, pois não conseguia reagir de nenhum jeito. Fui ao psiquiatra, recebi atestado, mas o professor não aceitou. Então, reprovei na disciplina. ”, depoimento anônimo.

Há professores que não estão preparados para receber alunos, que têm alguma fobia social, ansiedade ou depressão. “São profissionais que não estão acostumados com esse tipo de situação ou com alunos que tenham esses transtornos”, afirma Carlos Décimo. Então, é preciso trabalhar essa questão com os docentes. O Laboratório de Práticas de Psicologia pretende fazer um projeto que auxilie os professores a lidar com isso.

“Queria participar dum grupo de pesquisa. No entanto faltei alguns encontros, porque estava com crises de ansiedade. Tentei explicar para o professor ele disse que não queria alguém como eu no grupo dele e me mandou procurar um psiquiatra. Tive que ir embora da aula de tanto que chorei. E também, odeio tanto quando as pessoas se sentem orgulhosas por passarem a noite a base de café fazendo trabalho e quando tu não concordas com isso te acham preguiçosa e irresponsável. ”, depoimento anônimo.

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O vestibular passou e o estudante  foi aprovado. O que vem agora?

Durante o Ensino Médio os alunos são preparados incansavelmente para prestar vestibular. É o início de uma vida rodeada de cobranças. A pressão para entrar numa universidade é tão grande que muitos estudantes começam a desenvolver problemas psicológicos que poderão acompanhá-lo no decorrer da graduação. Muitos quando se inserem no Ensino Superior acabam se frustrando com a realidade da nova rotina. A universidade pode ser bem diferente da versão romantizada que foi construída na escola.

As dificuldades, os trabalhos, provas, cobranças, a insônia, exames, a falta de tempo e a incerteza sobre a escolha para a futuro, podem desmotivar os estudantes e serem o começo para problemas mais graves no futuro.

“Estou no primeiro semestre e senti uma enorme diferença do ensino médio para o ensino superior, eu tento acompanhar, mas é muito complicado, minhas notas estão ruins, mas eu sei o conteúdo. Então tem algo errado, o estresse é tão grande que faço tudo errado na hora da prova”, depoimento anônimo.

O que fazer para lidar com o estresse?

Não é fácil lidar com as cobranças que surgem na faculdade, sejam elas pessoais, familiares, ou dos professores. Mas é preciso encontrar meio de lidar com as emoçções ruins para seguir os estudos sem mais problemas. Especialistas indicam as seguintes atitudes:

  • Conheça seus limites. Saiba o momento de parar e reconheça que todos têm limites, ninguém é obrigado a ser bom em tudo o tempo todo.
  • Manter o sono em dia é fundamental para um bom rendimento na faculdade – e na vida.
  • Alimente-se bem
  • Faça exercícios físicos
  • Reserve um tempo para você. Leia um livro, assista um filme ou uma série. O importante é fazer algo que te dê prazer.
  • Ouça músicas que você gosta. Cantar a plenos pulmões e dançar loucamente são ótimas atividades para relaxar o corpo e a mente.
  • Planeje seus dias e atividades. Uma boa organização das tarefas e horários faz com que você tenha controle do que está acontecendo.

“Às vezes fico triste por não tirar uma nota boa, ou frustrado por não cumprir uma meta que estabeleço. Entretanto, não costumo levar isso até meu limite psicológico, pois sei que isso não é saudável. Por isso, tenho consciência de que a vida acadêmica pode ser desgastante para a saúde mental”, depoimento anônimo.

(Fonte: http://centralsul.org/2016/sofrer-nao-e-normal-quando-a-faculdade-se-torna-um-peso/)

Como o tédio pode ajudar seu filho a se tornar uma criança auto-suficiente

17-07-17-01

Férias chegando e a gente já começa a ter palpitações nervosas só de pensar como vamos fazer para deixar as crianças ocupadas, colônias de férias, hotéis com atividades infantis, talvez um cursinho de artes ou culinária?

Opções com precinhos bem salgados para preencher o tempo das crianças não faltam.  Mas psicólogos e especialistas em desenvolvimento infantil são unânimes: manter a agenda infantil lotada durante das férias não é apenas desnecessário, como pode até evitar que os pequenos descubram o que eles realmente gostam de fazer.

Ser um adulto bem sucedido, não significa apenas ter um trabalho bacana, mas saber ocupar e preencher o tempo livre com atividades que gerem felicidade. “Se os pais estão sempre preenchendo eles mesmos a agenda dos filhos, os filhos não tem a oportunidade de aprender a a preencher as lacunas eles mesmos”, explica Lyn Fry, psicóloga infantil baseada em Londres.

A internet e todas suas possibilidades podem ter minguando nossas chances de sentir tédio, mas especialistas vem discutindo a importância de fazer nada há décadas. Não ter nada para fazer nos dá uma chance para contemplar a vida e descobrir nossos interesses. Tédio e imaginação estão ligados: a monotonia ajuda a desenvolver um “estímulo interno” que possibilita a verdadeira criatividade.

Tudo muito interessante, principalmente se não tem uma criança correndo atrás de você, com a cara mais triste do mundo e fazendo a pergunta mais temida de todas: “O que eu posso fazer agora?”

Em entrevista, para o site Quartz, a psicóloga Lyn Fry sugere que ao começar as férias os pais sentem com o filhos, pelo menos com os maiores de 4 anos, e escrevam juntos uma lista com tudo que eles acham que podem gostar de fazer durante o tempo livre. Podem ser atividades simples como: jogar um jogo, ler um livro, desenhar ou dar um passeio de bicicleta mas também ideias mais elaboradas como preparar uma refeição, organizar uma peça de teatro ou praticar fotografia.

Quando a criança reclamar que não tem o que fazer, pegamos a lista e damos uma olhada junto com eles. Segundo Lyn, desta forma nós passamos a responsabilidade para a criança: “Isso é o que eu decidi fazer, o que eu gostaria de fazer”

É bem possível que o o exercício da lista não resolva sempre e de prontidão a questão do tédio. Mas o que pode nos tranquilizar diante da carinha de descontentamento dos pequenos é que, diferente do que este mundo cheio possibilidades nos leva a acreditar, não ter o que fazer não é tempo perdido.

As crianças precisam de tempo para parar e observar seu entorno. Precisam de tempo para imaginar e desenvolver seus próprios pensamentos e assimilar as experiências de suas vidas brincando ou apenas observando o mundo ao redor delas.

“Não há nenhum problema em se entediar”, diz Fry. “Não é um pecado. As crianças tem que se auto-motivar a fazer coisas. Tédio faz com que as crianças se tornem autônomas”. A ideia é que eles aprendam a enfrentar a monotonia de maneira produtiva.

Afinal, quem nunca sentiu tédio nesta vida?

(Fonte: http://tudosobreminhamae.com/blog/2017/6/23/frias-tranquilas-a-importncia-do-tdio-para-criar-crianas-auto-suficientes)