Dor no peito: como o luto pode causar sintomas físicos

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Nada havia preparado a britânica Shira Schiller para a dor que ela sentiria ao perder repentinamente seu filho Max, vítima de um problema cardíaco quando ele tinha apenas 10 anos. Inclusive a dor a física.

“É como se alguma coisa estivesse sentada sobre seu peito”, contou a mãe de 47 anos. “Como se houvesse uma mão segurando seu coração. Se estou em um dia ruim, é como se não fosse capaz de respirar.”

Schiller não está sozinha. Lyn Rigby, de 49 anos, disse à BBC sentir uma “constante dor no peito” desde 2013, quando seu filho Lee foi assassinado em Londres. Um mal que “nunca vai embora”.

Termos como “dor no coração”, “ferida” e “dor” são normalmente usados para descrever o trauma emocional. Mas pessoas afetadas pela perda de um ente querido costumam dizer que não se trata apenas de uma figura de linguagem: elas relatam realmente vivenciar essas sensações fisicamente.

Subprodutos da perda

Estômago revirado, coração acelerado, tremedeira, flashbacks e hipersensibilidade ao barulho são alguns dos subprodutos físicos da perda, segundo a Sociedade Psicológica Britânica.

Mas como as pessoas costumam reagir de formas diferentes ao luto, ainda não há uma lista uniforme de sintomas.

A locutora de rádio Barbara Want recorda ter notado uma sensação intensa em seu estômago após a morte de seu marido, o apresentador da BBC Nick Clarke, em 2006. “Era um peso forte, muito forte. Quase como estar doente, com um quadro bem ruim de gastroenterite.”

Want, que agora preside uma entidade que ajuda crianças a superar o luto, a Winston’s Wish, afirma que se alimentou sem sentir qualquer prazer nisso por dois anos. Não sentia fome naquela época.

“Fiquei tão magra que percebia as pessoas olhando para mim com horror.”

Ela também desenvolveu uma rouquidão na voz – segundo um cirurgião, resultado do choque vivido por seu corpo.

Físico e emocional

Cientistas sabem há algum tempo que o luto pode se manifestar não só emocionalmente, mas também fisicamente.

Em exames realizados pela Universidade da Califórnia em Los Angeles, a Ucla, pesquisadores mostraram que a parte do cérebro que lida com a dor física – o córtex cingulado anterior – também processa a dor emocional.

Sensações ruins relacionadas ao peito são tema recorrente.

“Tenho alguns pacientes que, após um episódio emocional estressante, sentem dor no coração ou palpitações”, afirma Alex Lyon, professor do Imperial College London, de Londres, e cardiologista consultor honorário no Royal Brompton Hospital.

Esses são os sintomas da “síndrome do coração partido”, ou cardiopatia de Takotsubo, algo que geralmente ocorre após um “significante estresse emocional ou físico”, segundo descrição da Fundação Britânica para o Coração (BHF, na sigla em inglês).

Acredita-se que esse mal afete cem a cada 1 milhão de pessoas por ano. Nele, o músculo do coração fica fraco de repente, e uma das câmaras do órgão muda de forma.

Um estudo do Imperial College London sugere que isso se trata, na verdade, de um mecanismo de defesa do coração ao se deparar com a onda muito forte de adrenalina que costuma acompanhar situações de choque e luto.

Imunidade prejudicada

A perda de alguém próximo também pode deixar uma pessoa mais vulnerável a infecções.

Um estudo da Universidade de Birmingham, no Reino Unido, descobriu que aqueles que viveram recentemente um quadro de luto, especialmente idosos, podem passar por um processo de redução das funções dos neutrófilos – a parte mais abundante dos glóbulos brancos do sangue, responsáveis por combater bactérias como a da pneumonia.

Isso talvez ajude a explicar alguns dos muito noticiados casos de casais de idosos que morrem praticamente juntos.

Em 2014, Clifford e Marjorie Hartland, da cidade britânica de Coventry, morreram em um intervalo de 14 horas em seu 76º aniversário de casamento.

No mesmo ano, Don e Maxine Simpson, de Bakersfield, Califórnia, morreram com quatro horas de diferença em camas vizinhas, segurando as mãos um do outro em seu último momento juntos. Eles estavam casados havia 62 anos.

“As pessoas dizem que se morre de coração partido. O que nós diríamos é que eles estão morrendo dos efeitos desses fatores em seu sistema imunológico”, afirma Anna Philips, professora de Medicina Comportamental da Universidade de Birmingham e responsável por liderar os estudos que correlacionaram o desempenho dos neutrófilos e o luto.

Outra pesquisa conduzida por ela e outros colegas concluiu que pessoas que vivenciaram uma perda no último ano produzem menos anticorpos em resposta a uma vacina.

Consequências inesperadas

Mas apesar do peso do conhecimento científico sobre o relacionamento entre luto e o desconforto físico, os sintomas costumam ser completamente inesperados.

“Às vezes as pessoas ficam bastante chocadas com como se sentem fisicamente e preocupadas achando que há algo errado com elas”, conta Jessica Mitchell, gerente do serviço de apoio telefônico da ONG Cruse Bereavement Care.

As pessoas que entram em contato com a organização também costumam reportar sentirem-se cansadas, dormindo mal, com mudanças no apetite e no ciclo menstrual e aparentam ficar doentes mais facilmente, explica Mitchell.

Entretanto, isso não é muito conhecido. “As pessoas realmente não entendem, porque não se fala sobre isso”, explica Susan Hughes, da ONG Compassionate Friends, que presta suporte aos familiares após a morte de crianças.

Schiller, a britânica que perdeu o filho de apenas 10 anos, lembra que conversar deixou claro que ela não estava enlouquecendo – ou seja, que aquela sensação em seu estômago era tangível e real.

“Nós dois, eu e meu marido, falamos sobre essa sensação física de luto”, ela afirmou. “Nós percebemos que estávamos sentindo a mesma coisa.”

A falta de compreensão reflete a dificuldade da sociedade em falar francamente sobre o luto e a perda, acrescenta.

“Trata-se de um grande tabu. As pessoas não querem ouvir você falar sobre isso.”

Fonte: http://www.bbc.com/portuguese/geral-37030767?ocid=socialflow_facebook

Tentativa de suicídio na criança e no adolescente: vamos falar sobre isso?

suicidio infancia e adolescencia

Seguindo a linha do outubro rosa e do novembro azul, poucos sabem, mas setembro também foi um mês de cor e de mobilização por uma causa importante. O chamado “setembro amarelo” é internacionalmente conhecido como o mês de alerta para o Suicídio.

Este tem sido um grande tabu para a sociedade, dificultando a troca de informações entre as pessoas. Por motivos religiosos, sociais e até econômicos, poucos tem coragem de falar sobre isso, e, quando falam, quem escuta não tem a menor noção de como agir. Apesar de silencioso, o problema está aí, e cada vez maior e mais intenso. A estimativa para os dias atuais é de que cerca de 800 mil pessoas cometam suicídio anualmente. E o pior é que este é um número bem abaixo do real, afinal, muitas intoxicações por venenos, uso abusivo de remédios, atropelamentos, acidentes automobilísticos, ferimentos por armas brancas ou armas de fogo passam despercebidos como possíveis causas de morte autodirecionada.

O suicídio é só a ponta de um grande iceberg. Quantos são aqueles que pensam, planejam e agem direcionando-se à morte sem necessariamente fazê-lo? (…) Estima-se que apenas 1% dos chamados “comportamentos suicidas” chegam realmente ao sistema público de saúde. O restante, passa despercebido, sendo escondido pelo próprio indivíduo ou pela família, achando que “um dia passa” ou que “era uma tentativa de chamar a atenção”.

E assim, os números vão crescendo. Calcula-se que entre 2000 e 2010 tenha havido um crescimento de cerca de 30% da incidência de casos de suicídio na população jovem. Esta é a parcela da população de maior impacto e na qual, infelizmente, mais vem aumentando os casos de comportamentos suicidas. Nossos jovens estão buscando a própria morte e ninguém tem falado sobre isso. Falta a informação à população de que isso existe, e que pode até ser uma tentativa de chamar atenção, mas se este jovem precisa de algo tão extremo para chamar a atenção, é um sinal de que algo não vai bem em sua vida psíquica…

Adolescentes a partir dos 11 anos têm um conhecimento mais claro do que é a morte socialmente conceituada. Nestes, muitos comportamentos são direcionados com a intenção de chegar-se ao ato. Abaixo desta faixa etária, em crianças, a intencionalidade da morte nem sempre é tão óbvia assim. Até porque a morte, para muitas crianças, pode ser apenas uma forma de dormir mais cedo ou uma forma de “encontrar” um ente querido ou até um animal de estimação do qual sente muita falta.

De qualquer forma, devemos nos alertar a qualquer comportamento lesivo autodirecionado, independentemente da idade da pessoa que o comete, da intencionalidade ou do real conhecimento do conceito da morte. Precisamos nos atentar às diferentes formas de se pedir ajuda, inclusive as que não passam tão claramente pelas palavras, e sim por atos.

Muitas vezes, a família, contaminada pelos sentimentos de raiva, impotência, desespero ou dúvida, acaba não conseguindo perceber claramente o risco dos atos. Por isso, a avaliação da real intencionalidade e do risco de novas tentativas precisa SEMPRE passar pelo julgamento de um médico com habilitação e experiência no assunto. Escute nossos jovens, eles podem estar querendo falar.

Dr. Felipe Pinheiro de Figueiredo, médico Psiquiatra da Infância e Adolescência, CRM-PR 31918, Especialista em Análise do Comportamento, Doutor em Saúde Mental pela faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FMRP-USP). Atua na “Essentia- Clínica de Psiquiatria”, em Maringá, no Centro de Atenção Psicossocial Infanti-juvenil (CAPSi) e é professor de Psiquiatria do curso de Medicina da UNICESUMAR.